domingo, 31 de julho de 2016

Viver com o filho da mãe do -ismo

O diagnóstico veio tarde, mas não foi por isso que tivemos mais tempo para nos preparar. Nenhuma mãe nem nenhum pai está preparado para lidar com um filho com uma diferença, seja ela qual for. Sou professora e todos os alunos que já tive podem testemunhar que sempre estimulei a diferença, o pensar fora da caixa, o desbravar caminhos novos, o não se contentarem com o "normal", o comum, o banal. E o mesmo continuarei a pregar. Mas quis a ironia do destino que a diferença me caísse, literalmente, no colo. "Bem, mãe, ele está dentro do círculo das perturbações do espectro do autismo", afirmou a neurologista. Toma lá este soco no estômago. Mas sabem o mais engraçado? Se sentimos dor, medo, ira, desespero quando ouvimos um diagnóstico destes? Sim. Mas o que senti mais? Alívio. Finalmente, ao fim de 6 anos, tinha um nome. Os rótulos são terríveis e nada pior para uma adepta do lema "vive e deixa viver", mas o meu lado pragmático gritava por um nome. "Agora que sei que é isto (embora não fizesse ideia, na altura, o que era realmente), há que arregaçar as mangas e pôr mãos à obra", pensei.

Passei este último ano com o nariz enfiado em livros da especialidade, em sites e fóruns do tema, bebendo de experiências narradas por esta internet fora. E sei que estou no caminho certo, agora. E não há melhor sensação que essa. Sentir que cada dia que passa entendo um pouco melhor o meu filho. Entendo melhor o seu presente, entendo finalmente o seu passado e procuro entender para construirmos juntos o futuro. De repente, a alvorada às 6 da manhã, o não responder ao seu nome, especialmente quando desatava a fugir na rua, o comer por texturas, a obsessão pelos puzzles, o fazê-los de tantas peças, sem olhar para o desenho, a memória para as canções, para as falas dos filmes, a rigidez nas rotinas, o tapar de ouvidos a qualquer barulho diferente ou alto, o fugir em momentos de frustração ou confusão, o olhar para as coisas e para o ambiente à sua volta como quem vê algo que os demais não vêem...de repente, tudo isso se clarificou.

Apesar de ser este o diagnóstico, é na sua forma ligeira, o que temos de agradecer e lutar todos os dias para atenuar comportamentos, celebrando cada conquista. Às vezes, penso que o problema não está nele, mas em todos nós, que não paramos para pensar e compreender que existem várias formas de olhar o mundo. A lente dele tem apenas uma resolução diferente.


1 comentário: